[ressaca]

Passou-se a euforia de uma das mais políticas award seasons que tivemos em algum tempo. O circuito comercial volta ao seu estado de estagnação (até que algum blockbuster deslanche na grade de programação) e para os mais assíduos fica a expectativa da listagem oficial do Festival de Cannes que acontece logo mais. Nessa época, de alguma forma, sempre dá para tirar proveito de um ou outro lançamento interessante que recebe as graças de ser distribuído num cineplex da vida, vide o novo do Cronenberg que estreia em todo o país depois de quase um ano atrás Julianne Moore levar o prêmio de melhor atriz em Cannes.

Eu particularmente aproveito essa época menos prolífica para tirar o tempo perdido da award season e ver alguns filmes que acabei perdendo do ano anterior (além de uma sessão-ritual de Meninas Malvadas, claro). Também é bacana porque nessa época sobra tempo de pegar algum diretor cultuado e fazer uma maratona (p. ex., desde o último mês venho fazendo uma visita na filmografia do Hitchcock, enquanto leio Hitchcock/Truffaut pela primeira vez).

No mais, ainda sem inspiração p/ um post decente sobre Hitchcock, fica o registro de alguns lançamentos de + em breve que vi nas últimas semanas:

Kingsman: Serviço Secreto, dir. Matthew Vaughn, 2015 (**¹/²)
62Não sou um grande fã de Primeira Classe, mas Vaughn é um diretor que me cativa mesmo quando erra feio, já que sempre o vi como um artesão e um ponto comum entre Guy Ritchie e Edgar Wright. Porém, desde que fez o primeiro Kick Ass, ele parece ter perdido a mão criativa de misturar aquela boa dose de humor pop e ação estilizada (Kingsman me soa bem mais como um limite do melhor/pior que sua forma poderia chegar). E, embora o filme seja um desses guilty pleasures que não ofendem, também não deixa de ser um emaranhado de soluções problemáticas. Numa tentativa frustrante de extrair de sátiras e gags espertinhas um toque minimamente sentimental que se pretende com o arco que conduz o microcosmo do protagonista interpretado pelo carismático Taron Egerton, Kingsman, no fim, é Vaughn fazendo o típico piloto automático de diretor de estúdio.

118 Dias, dir. Jon Stewart, 2015 (*)
66Jon Stewart declarou uma vez que já escreveu inúmeros filmes sob efeito da maconha, mas droga nenhuma deveria ser culpada pelo resultado disso aqui.

Mapas Para as Estrelas, dir. David Cronenberg, 2014 (****)
69Os últimos dois filmes do Cronenberg são quase obras-primas, e eu não esperaria algo menos que maravilhoso de Mapas Para as Estrelas por duas razões: 1) é a versão perturbada dele p/ Crepúsculo dos Deuses; 2) tem Julianne Moore. No entanto, não imaginava ser surpreendido tão positivamente, já que não lembro a última vez que vi Cronenberg dirigir um elenco tão desprendido do potencial dramático do mesmo (e isso se tratando de um filme milimetricamente formulado). É deliciosamente impressionante como Cronenberg constrói toda a ideia de que esse é um filme puramente sintético brincando com as possibilidades e os limites do banal, sem em nenhum momento perder o controle da mise en scène. Isso tudo só comprova que ele nunca esteve tão em forma com seu cinema como atualmente.

Renascida do Inferno, dir. David Gelb, 2015 (**¹/²)
77Não mais que uma compilação de efeitos e maneirismo do cinema de horror da última década, o mais legal de Renascida do Inferno é que David Gelb brinca com a ideia do trashism de forma bastante inventiva, e, embora as soluções sejam das mais previsíveis e preguiçosas possíveis, o filme consegue ser bem mais divertido que qualquer sequel de Atividade Paranormal.

Gerontofilia, dir. Bruce LaBruce, 2013 (**)
70Nunca vi em LaBruce um diretor promissor, mesmo eu achando cativante que ele ao menos tente ser um à sua maneira. Otto, p. ex., mesmo que um filme cada vez menor numa revisitação, é ainda um produto marginal por excelência. Não à toa, quando li as primeiras informações de Gerontofilia, eu realmente estava empolgado para ver o resultado, principalmente porque desde o início me parecia ser um LaBruce mais contido a realmente contar uma história do que expressamente chocar pelo puro prazer do choque. E se por um lado o filme consegue aproveitar o que melhor o tema tem pra oferecer quanto melodrama, por outro a estética parece bem mais com algo que Xavier Dolan faria. Em algum momento da trama uma das personagens explica porque o envolvimento do protagonista com um idoso é um ato simbólico, e é justamente por se desdobrar de maneira tão expositiva que o filme perde todo o charme que pretendia alcançar.

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